Passeriforme

Ao vasculhar uma "lista" de centenas de animais atropelados, em ficheiro Word, encontrei à mistura estas imagens (frames vídeo, com duplicador e a grande distância):







Caldas da Rainha - Campo, Set. 2003

Acrescento mas info à discussão, conforme os comentários.

Não tem mau aspecto, mas os aspectos cruciais não são visíveis. Não dá para ver o vídeo?

data e local?

Boa! Nem tinha visto que há data nos fotogramas (por lapso esqueci-me de desactivar isso na câmara, o que afinal se revela útil pois não tenho acesso fácil ao vídeo e já que frames só mostram a data da criação dos mesmos (nas propriedades, 16 Dez 2003).
Local, aqui: https://www.google.pt/maps/@39.4312679,-9.1491521,50m/data=!3m1!1e3

PNicolau escreveu:Não tem mau aspecto, mas os aspectos cruciais não são visíveis. Não dá para ver o vídeo?

Infelizmente não liguei a detalhes cruciais quanto retirei esses frames. Era bom que ma primeira foto não tivesse a ponta da asa tapada, para pelo menos confirmar o seu tamanho em relação às sub-caudais (mas qualquer apreciação de relação de tamanho das estruturas não parece fiável em qualquer das fotos). Na ultima, as asas estão em plano decrescente para trás, ao contrário da cauda.

No campo e no vídeo, são notórios por ordem decrescente:
- "Espelho" extremamente conspícuo, visível à distancia (no campo e em vídeo);
- Bico de aspecto "pesado" (no campo e em vídeo);
- Ave com a "frente" desproporcionada (no campo e em vídeo); "cabeçuda e peituda" não sendo isso compensado pelo conjunto da traseira (no campo e em vídeo).
- Peito amarelo e costas mais pálidas (só no campo e o aspecto pálido vinha dos "espelhos" nas asas).

Os frames são sempre muito limitados e pela minha experiência nem todos os detalhes aparecem fieis. O mais alterado é sempre a cor.
Comportamento: temerária, não se deixando aproximar, fugindo sempre em direcção ao grupo denso de salgueiros e difícil de seguir nos mesmos.
Outra característica desta espécie, sempre que a vi de relance (dando para reconhecer detalhes) é quando chega, atirar-se ruidosamente à folhagem (tem impacto), normalmente qdo estou parado num local e chega uma aos arbustos próximos.

A meu ver só o vídeo confirmaria estes" frames" como de icterina, devido a má qualidade dos mesmos (e serem poucos). Mas ficam as dicas.

Para identificar icterina, alguns aspectos importantes teriam de ser visíveis:
- fórmula alar, nomeadamente primárias (comprimento das primárias face às terceárias, comprimento da P1 face às coberturas primárias, primárias que formam a ponta da asa, espaçamento das primárias)
- painel alar, que deve ser pálido

Nota que icterina é uma espécie clássica de pitfalls. Já muito bons observadores caíram em erros de identificação, com aves que apresentavam primárias mais longas, patas mais azuladas (presentes em juvenis de poliglota), cabeças com testas mais acentuadas e bem amarelas (comum em juvenis de poliglota).

Resumindo, icterina não é uma espécie comum e muito menos fácil de identificar.
Deixo aqui dois exemplos de aves que foram identificadas por vários como icterinas, mas vieram a ser descreditados pelas fórmulas alares.

https://www.flickr.com/photos/diniscortes/4044645804/in/set-72157622549488219/
https://www.flickr.com/photos/diniscortes/7989844673/in/photostream/

Discussão elucidativa:
http://www.birdforum.net/showthread.php?t=240126&highlight=icterine+portugal

Deixo aqui também a nota de que icterina é uma espécie mais provável de aparecer na Primavera e não Outono, como muita gente poderá pensar.

Quando encontrares uma no campo, pelo menos uma bem típica, não há que enganar muito noutras características importantes (mais intuitivas, mas que cativam logo a atenção).

Já tinha visto ambas essas fotos e, apesar de uma delas enganar um pouco quanto às projecção das primárias, é no resto de poliglota chapada.
Penso que a barra alar das icterina é bastante visível no Outono depois da muda, às vezes também extensivo à mais "ampla" plumagem das coberturas (comparando com a poliglota) que parece mais clara pelo menos sem ter sofrido desgaste (na foto parece isso mesmo, mas na realidade era a barra alar que se destacava ao longe bem como espelho, e não as coberturas).

Paulo Lemos escreveu:Quando encontrares uma no campo, pelo menos uma bem típica, não há que enganar muito noutras características importantes (mais intuitivas, mas que cativam logo a atenção).

Ok, aceito em parte, mas a nossa intuição falha, muitas vezes.
E há que ter especial atenção com espécies com esta. E o modo como uma série de características secundárias podem influenciar a nossa percepção, uma vez que não são decisivas.

Mas sim, há aves óbvias.
Tipo esta:

Ao vivo, o painel parece-me sempre bem mais conspícuo, talvez porque na maioria das fotos na net, as aves devem já ter algum desgaste de plumagem.
O painel passa por um zona quase branca, nota-se bem de lado como uma linha ou área larga e "brilhante" (ver as duas fotos seguintes, apesar de a linha não acompanhar as terciárias, como talvez no Outono se notaria mais).
Nos frames, não é muito evidente nem contrastante, talvez pela posição da ave e luzes. É difícil "provar" que não é só efeito, pois a qualidade é fraca.










O "tamanho" da ave também se nota no campo, se a vegetação deixa transparecer (excepto essa e outra observação, tem sido sempre no meio de arbustos).
A ave em questão foi fotografada perto de Saxicola rubetra e algumas M. flava, mais ou menos com o mesmo corpo e bem maior do que uma P. trochilus presente. Impossível confundir essa ave com uma Phylloscopus, mesmo que ambas não se mexessem (já não se pode garantir o mesmo com poliglota).
Independentemente da diferença real de tamanho entre as duas (que não é muita) e movimentos (que diferem um pouco), a icterina tem mais aspecto de "ave maior" e a plumagem parece menos "rasca" (menos "frágil") do que a da poliglota.



Nas foto seguintes, os exemplares parecem ter a plumagem menos gasta e já se nota mais o efeito nas terciárias. Sei que as plumagens podem variar em qualquer espécie e cada ave apresentar mais ou menos "franja" nas penas (*à falta do nome certo) e certas condições de luz também destacam melhor os contrastes, incluindo nas coberturas. Mas nas icterina observadas, os espelhos destacavam-se mesmo bem de tudo, tão ou mais claros do que o peito/ventre, formado uma "mancha" larga quando bem exposta. Ao longe também.
Vendo bem agora as fotos desta espécie, a cauda parece ter também mais "franja", clara (se não estiver muito desgastada?).
Com base nisto, não deve ser muito difícil distinguir as espécies, pelo a maioria dos espécimes no Outono (se estes se deixarem ver bem expostos e de cima para baixo ou pelo menos de lado).

Uma poliglota que poderia confundir, especialmente devido à luz (na minha opinião) e apesar de o "efeito painel" não ser o mesmo.


No entanto, o suposto painel cobre muito mais a superfície total da segunda metade asa e, se a ave estivesse de frente, não deixaria ver tanto da projecção das primárias. Isto interessa talvez, se a segunda foto da ave a identificar está em posição parecida, ou ainda menos boa, do que primeira que postei uns posts acima para exemplo. Vê-se algo para lá do painel.

Um dia procuro o vídeo (tipo uma agulha no palheiro das cassetes, num interminável processo que me dá completamente cabo dos nervos).

Paulo Lemos escreveu:
Comportamento: temerária, não se deixando aproximar, fugindo sempre em direcção ao grupo denso de salgueiros e difícil de seguir nos mesmos.
.

Temerária significa exactamente o oposto da tua descrição, sendo usado normalmente como alternativa a arrojado.

Paulo Lemos escreveu:Ao vivo, o painel parece-me sempre bem mais conspícuo, talvez porque na maioria das fotos na net, as aves devem já ter algum desgaste de plumagem.

Ao vivo o painel parece-te sempre mais vivo, mas mais vivo em icterina ou em poliglota?

Na icterina. Como uma espécie de mancha triangular bem mais clara do que a parte superior da ave e talvez o resto (visto de longe é o que convida a seguir com mais atenção, fora o tamanho (ave peituda). Foi o caso dessa ave, topada como "diferente", primeiro a olho nú entre 2-3 P. trochilus a bastantes metros de mim (e sou míope desde criança (-0,5, -1)). Na net, acho que as aves estão já muito desgastadas e a mancha parece apenas uma "linha". Na zona há também H. polyglotta (nidificantes até hoje) e eu estava habituado a elas (não me chamariam a atenção).
Não digo que seja um painel tão evidente como as do rabirruivo, como é óbvio, mas nota-se bem em qualquer posição em que é visto.

Um dos melhores sítios talvez para encontrar uma, será talvez o denso e alto canavial do Rio da Cal, a partir das Àguas Santas. Sempre que as vi (incluindo essa ave), estava estacionado bem calmo num local em espera, camuflado ou não. Foi sempre em Fins de Setembro, se bem me recordo, aquando do grosso das M. flava.

Paulo Lemos escreveu:Na icterina. Como uma espécie de mancha triangular bem mais clara do que a parte superior da ave e talvez o resto (visto de longe é o que convida a seguir com mais atenção, fora o tamanho (ave peituda). Foi o caso dessa ave, topada como "diferente", primeiro a olho nú entre 2-3 P. trochilus a bastantes metros de mim (e sou míope desde criança (-0,5, -1)). Na net, acho que as aves estão já muito desgastadas e a mancha parece apenas uma "linha". Na zona há também H. polyglotta (nidificantes até hoje) e eu estava habituado a elas (não me chamariam a atenção).
Não digo que seja um painel tão evidente como as do rabirruivo, como é óbvio, mas nota-se bem em qualquer posição em que é visto.

Um dos melhores sítios talvez para encontrar uma, será talvez o denso e alto canavial do Rio da Cal, a partir das Àguas Santas. Sempre que as vi (incluindo essa ave), estava estacionado bem calmo num local em espera, camuflado ou não. Foi sempre em Fins de Setembro, se bem me recordo, aquando do grosso das M. flava.

Nota por favor que só há 3 registos confirmados de Icterina em Portugal, duas delas em situações de anilhagem, e mais recentemente houve um 4º registo associado a uma deslocação massiva de migradoras devido a condições climatéricas anormais, ou seja e para colocar isto em contexto, apesar de em Portugal serem anilhadas muitas poliglotas, fotografadas muitas mais, e vistas mais ainda, só por 4 vezes se confirmou icterina, ou seja mesmo pessoas com experiência com a espécie no estrangeiro não a vêem cá.

Sem falar que em Espanha é também uma boa raridade e onde a maior parte das aves ocorreram na Catalunha.

Paulo, é literalmente impossível veres icterina com regularidade num local. Se aconteceu, então andaste a ver imaturos de poliglota, mais amarelos, patas azuladas e alguns com painel alar. Uma icterina já seria muito bom.
As dificuldades na identificação deixam claro que sem a ave na mão, sem fotos ou sem gravações um registo desta espécie não pode ter credibilidade.

Há fotos desses registos? Queria ver de um Outonal.

Aqui ninguém vos forçou ID, a partir destas imagens. E não faço ideia de como se observam passeriformes em Portugal, para opinar "se" e "como" poderia ter escapado esta espécie e tantas outras possíveis de ocorrerem no nosso país. Comparar com o estrangeiro fará sentido?

Com regularidade não me parece ter acontecido. 3-4 observações em 3 anos entre milhares de aves parece-me relativamente pouco, ainda mais sendo eu especialmente sensível a tudo o que é diferente e a sinais indirectos da presença de aves (sobretudo gritos interespecíficos umas às outras).
Em contrapartida, a poliglota foi das aves mais comuns aqui na região, por qualquer habitat. Ocupava em grande densidade todos os ambientes abertos e semi-abertos até à costa e nunca nenhum exemplar me motivou especial atenção devido alguma característica única (e lá variável é a espécie).
Já me lembrei de uma estirpe mais nortenha de polyglotta de passagem no outono, mais robusta e de plumagem "melhor" após a muda, mas essas diferenças não são muito frequentes nas "migradoras subsaarianas" e sim nas residentes, ou nas invernais por cá. Haverá tais estirpes?

Não deve ser uma observação comum, mas não me parece impossível como não excepcional, talvez mais a Oeste em várzeas húmidas com vegetação luxuriante não muito longe das linhas de costa, onde se poderão concentrar mais indivíduos "extraviados?" É só uma teoria.
No ano em questão fazia tudo para que não me escapasse nada e passava dias no campo. Apenas as vi no contexto descrito e quando, num dos dias, uma não me viu e pousou nos arbustos mesmo perto de mim (para fugir quase de imediato).

Não fazia, até há poucos anos, que seria "raridade".
Passei algum tempo a segui-las através da câmara (não é um telescópio mas ajuda, tinha zoom), podendo ter filmado bem mais e dado outra atenção aos vídeos...

Só encontro esta de Maio:

Já agora, uma poliglota com painel alar e icterina em fim de Agosto.

Fotos são sempre aquele problema quando não se notam os caracteres distintivos.
A cor e alguns detalhes das aves podem ser parecidos, mas pelo que percebo são espécies bem distintas, se observadas ao vivo e especialmente em liberdade em movimento (a não a ser que passem migradoras poliglota bem "diferentes" por cá em Setembro, que me enganem bem).
A poliglota é sempre uma "avezita" e a sua plumagem tem aspecto mais "débil", mesmo que ambas eventualmente meçam o mesmo tamanho. E por muito angulosa que possa parecer a cabeça e postura de uma poliglota, esta nunca parece tão peituda ou cabeçuda, pesada e desproporcionada.
Relacionando variações individuais, o painel alar será sempre relativo. As eventualmente mais incomuns poliglota com ele bem marcado, podem aproximar-se muito às icterica com ele menos marcado, pelo menos em foto, dependendo da altura do ano e talvez também idade (as jovens em Agosto terão já muda parcial, pelo menos do corpo e já não me recordo se também algumas coberturas). Já para não falar na abrasão e mudas de plumagem fora de época ou perda de penas, pois muitos factores ambientais e sazonais pode fazer variar bastante o aspecto de uma ave, após mudas normais ou não, como se confirma bem em ex-situ.

No caso de icterina, fotos são o que mais ajuda. Nas duas fotos dos links que mandei, vê-se o comprimento da P1 que é diagnosticante.

A observação desta espécie por mim, em condições normais de passeio pelo campo, limitou-se a um exemplar (e mesmo assim, eu estava parado nesse exacto momento). Os outros bichos, somente os vi estando eu "modo de espera", uma das vezes escondido. Eram bons locais para passeriformes migradoras insectívoras deste tamanho (locais que previamente sondei e confirmei "cheios" de aves, no inicio da década de 2000, de várias espécies, algumas que nem consegui filmar decentemente ou identificar).
Um dos locais é exactamente o canavial do Rio da Cal, outros são densos grupos de salgueiros ou ameal, por sorte mantidos ainda de pé (ou quase) em várzeas da região. Os locais pecam pela difícil detecção de aves num passeio "pedestre" normal, mas numa "espera" pode ser diferente.

Em termos de conservação, estas observações não têm interesse prioritário, pelo que não me justificam que perca tempo a investigar mais casos (ou arruinar a carola a procurar o vídeo, uma agulha no palheiro).
Mas aconselho aos interessados, uma melhor atenção para aves amarelas/verdes no fim do Verão que "parecem" maiores, em zonas húmidas e soalheiras com solos húmidos e vegetação luxuriante, normalmente cheias de insectos no fim do Verão (quando atingem auge de produtividade) e que atraem ou concentram muitas insectívoras, especialmente se tais zonas são raras ou dispersas numa região. Pelo menos a quem observa aves mais especificamente (e não natureza em geral) não custará "abancar" num bom local com visibilidade, a observar aves ou situações menos comuns como eu vi sem equivalente em 2001-2006.

Quanto ao facto de a anilhagem não apanhar mais desta espécie, não tenho sugestões, pois não conheço as práticas e opções que os adeptos fazem.

Excelente debate, melhor conversa. assim dá gosto!

A sério? E eu que só por causa das "tosses", meti um título menos sugestivo para que a malta passe à frente e se desinteresse..

Eu pessoalmente tenho muito interesse nesta espécie por isso o tema despertou-me a atenção.