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Raridades? talvez não...

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Mensagem por pedro121 Qui Jun 21, 2012 4:06 am

Eu observo aves á relativamente pouco tempo, e fora este fórum não tenho realmente muitas oportunidades de trocar ideias com outros observadores, já que na minha área de residência o numero de observadores é reduzido e o pessoal da fotografia é muito e bom mas para alguns temas de cariz mais abstrato não estão particularmente motivados.

Isto tudo para dizer que eu quando estou as vezes horas a ver gaivotas ou marítimas dou por mim a pensar porque é que algumas coisas são como são, nomeadamente porque é que o Roquinho Oceanodroma castro é considerado uma raridade em Portugal continental, é um facto que poucos observadores o viram, e existe um potencial risco de confusão com outros painhos, mas porque raio é que uma espécie que tem dezenas de casais nidificantes numa ilha ao largo da costa portuguesa é considerada uma raridade? Que sentido isso faz?

Podem argumentar que ele é uma raridade porque o numero de registos fora dos farilhões e zonas envolventes é muito pequeno, tudo bem, mas por exemplo a Calhandrinha-das-marismas Calandrella rufescens tem uma distribuição ainda mais restrita e é muito raramente vista fora de Castro Marim e no entanto não é considerada uma raridade.

O mesmo pode ser dito do cortiçol-de-barriga-branca que já foi considerado uma raridade e atualmente não é.

No outro extremo temos a felosa-pálida Hippolais opaca que é uma espécie que não é aparentemente vista anualmente e que é possível de ser confundida com outras espécies e no entanto..
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Mensagem por Rafael Matias Qui Jun 21, 2012 4:53 am

Olá Pedro,
penso que te referes a "raridade" como sendo uma espécie que requer homologação por parte do Comité Português de Raridades. O objectivo da homologação foi sempre o de obter e compilar informação de forma fidedigna que de outra forma seria difícil de acontecer.
As espécies que referes representam diferentes situações. O O. castro, apesar de se reproduzir nos Farilhões (e talvez Berlenga) é muito muito rara ao longo da costa. O mesmo não se pode dizer de outros paínhos, como o O. leucorhoa, Hydrobates ou Oceanites. A necessidade de homologação tem neste caso duas funções. Uma foi já referida, que é de que a informação recolhida seja devidamente recolhida. Outra é justamente de alertar os observadores que esta espécie é muito rara ao longo da costa (e não apenas raramente vista) e estimular a procura da mesma. Não estou em Portugal neste momento e não tenho as minhas referências à mão, mas penso que o número de registos da espécie desde o início de funções do CPR foi inferior a 3. Esta visão é partilhada por outros membros do CPR, como o CCMoore, que descobriu justamente a população nidificante nos Farilhões em 1983, que era um adepto fervoroso sdo seawatching e das pelágicas. Nos últimos anos não tenho feito muito seawatching, mas durante os muitos anos anteriores em fiz regularmente (semanalmente durante muito tempo) nunca avistei a espécie a partir da costa. Bem sei que já tiveste essa sorte, mas repara que Peniche é muito perto dos Farilhões e desse modo não surpreende. Claro que com as novas tecnologias que estão a ser aplicadas (seguimento com loggers GPS, etc) a informação que temos será revista e então logo se verá. No presente não sabemos onde anda a espécie ao longo da nossa costa e julgo que os argumentos se mantêm. Há ainda a ter em conta problemas recentes que irão agravar o problema da falta de informação, que é a divisão do O. castro em diversas espécies (das quais o O. monteiroi é uma) que irão tornar um verdadeiro desafio a identificação deste taxon a partir da costa (se é que não se tornará impossível...).
C. rufescens: sabemos onde a espécie está. Tenho muitas dúvidas sobre qualquer um dos registos feitos fora de Castro Marim. Não há falta de informação.
Pterocles alchata: não sabiamos onde a espécie ocorria em Portugal ou se ocorria de todo. Agora sabemos e o restante habitat é suficientemente coberto para confiarmos que não andam por outros sítios. É uma espécie ibérica que encontra em Portugal o limite ocidental da sua área de distribuição. Não há problemas de identificação e a informação sobre a espécie está a ser recolhida da forma mais correcta.
Hipolais opaca: mais uma espécie ibérica com limite ocidental em PT. Aqui a discussão fo mais longe no seio do CPR e houve dúvidas. É uma espécie que se reproduz em PT com cobertura deficiente. Durante 1999, quando estive a trabalhar no PN da Serra de S. Mamede observei por 3 vezes a espécie, duas delas em situação de nidificação. Não houve acompanhamento da situação em anos subsequentes, mas tudo indica que é apenas falta de cobertura. Mas há outras espécies que poderiam estar nesta situação. Por exemplo, se não se saísse à noite para fazer escutas ou sem gravações poderiamos pensar que o bufo-real seria uma espécie muito rara ou acidental.
A ideia é sempre de recolher informação até o padrão de ocorrência estar bem definido e com base em informação correctamente recolhida. Foi por isso que a Larus genei (e tb a L. audouini) deixou de ser considerada para homologação: os locais de ocorrência ficaram bem definidos, assim como o padrão temporal dos registos. Nos Açores há muitas espécies de origem neárctica que têm sido retiradas da lista de homologação, e em PT Continental o mesmo acontecerá a algumas num futuro próximo.
Na prática não há uma regra que sirva a todas as espécies e neste processo, que é completamente iterativo, há lugar para serem revistos estatutos caso informação adicional relevante apareça.
Põe questões destas sempre que te lembres. É sempre bom discutir. Não te garanto é sempre ter tempo para responder, principalmente nestes próximos meses.
Abraço e boas observações,
Rafael

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Mensagem por pedro121 Qui Jun 21, 2012 7:34 am

Rafael Matias escreveu:Olá Pedro,
penso que te referes a "raridade" como sendo uma espécie que requer homologação por parte do Comité Português de Raridades. O objectivo da homologação foi sempre o de obter e compilar informação de forma fidedigna que de outra forma seria difícil de acontecer.


Eu concordo que o objectivo principal da homologação de registros de espécies raras por parte de órgãos como o CPR é validar registos das mesmas quando a frequência destas não permite um estudo “normal” e muitos dos registros são obtidos por observadores/fotógrafos que podem com facilidade cometer erros de id.

Até aqui tudo certo, no entanto no caso do O. castro tal não é a meu ver necessário, a área de nidificação é conhecida e muita da informação necessária para o estudo da espécie pode ser obtida através de meios normais, para não é realmente necessária a homologação pelo CPR de registros de individuos, quando actualmente se está a colocar dataloggers em indivíduos quando estão presentes na colonia, parece-me a mim que a utilidade da homologação dos registros efectuados ao longo da costa é pequena e que no futuro será mesmo inexistente. A espécie pode e deve ser acompanhada pelos métodos normais usados com outras espécies que se reproduzem em território nacional. Tanto mais que o numero de registros efectuados é pequeno.

Rafael Matias escreveu:C. rufescens: sabemos onde a espécie está. Tenho muitas dúvidas sobre qualquer um dos registos feitos fora de Castro Marim. Não há falta de informação.

Certo, tambem sabemos onde o castro está, pelo menos tanto quanto o possivel para uma especie oceanica, e o que não sabemos ainda ficará futuramente claro com o acompanhamento de individuos com dataloggers.

Rafael Matias escreveu:Hipolais opaca: mais uma espécie ibérica com limite ocidental em PT. Aqui a discussão fo mais longe no seio do CPR e houve dúvidas. É uma espécie que se reproduz em PT com cobertura deficiente. Durante 1999, quando estive a trabalhar no PN da Serra de S. Mamede observei por 3 vezes a espécie, duas delas em situação de nidificação. Não houve acompanhamento da situação em anos subsequentes, mas tudo indica que é apenas falta de cobertura.

Sim, mas é uma situação que levanta algumas questões, eu não tenho duvidas que ela ocorra durante a passagem, como nidificante é também possível que seja regular, mas o painho-da-madeira é regular, com um efectivo populacional mais ou menos conhecido, as duvidas nesse caso prendem-se com áreas de alimentação etc... que devem ser esclarecidas não através de observações pontuais a partir da costa, mas sim com outro tipo de metodologia.


Rafael Matias escreveu:A ideia é sempre de recolher informação até o padrão de ocorrência estar bem definido e com base em informação correctamente recolhida.

No caso do Oceanodroma tal já existe, ou não? Smile Na pratica qual é a diferença entre a situação do Oceanodroma e outra especie nidificante em Portugal que seja pouco estudada?


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Mensagem por Rafael Matias Qui Jun 21, 2012 9:32 am

Penso que estamos de acordo então.
Repara que o que dizes em relação ao O. castro foi na realidade o que eu disse no que escrevi. Os estudos com data loggers estão no início com essa espécie. A necessidade de homologação vem de muito antes de se imaginar que iria ser possivel ter um dispositivo suficientemente leve e pequeno para poder ser transportado por uma ave marinha de 45-50 gramas, o que só foi possível nos últimos anos. Como disse acima, o processo é iterativo: com mais conhecimento far-se-ão modificações quando e se necessário. Essas alterações não devem ser feitas apressadamente, uma vez que não há qualquer ganho com isso (opinião pessoal). Quando houver essa informação disponível, e dependendo das conclusões poderá ser feita uma alteração. Imagina, por hipótese, que se conclui que as áreas de alimentação da espécie durante a época de reprodução se encontram fora da ZEE portuguesa. Então nesse caso retirava-se a necessidade de homologação? Como vês isto não é propriamente linear e não tem que haver uma implicação directa de uma coisa na outra. De certa forma podem complementar-se.
Por outro lado, repara que nada nos diz que a ave que foi capturada no Algarve, por exemplo, provinha dos Farilhões. A ave capturada pode dizer-se que é um Oceanodroma castro sensu lato, pois não se conhece a população de proveniência, e só. Neste momento, se tivesse sido cortado um pedacinho de pena da ave (por ex) já seria possível saber de que colónia teria provindo (e de que população), com análise de isótopos estáveis (que é uma das áreas em que trabalho com aves marinhas). Para quem está a ler e não sabe, em muitas das colónias da "espécie" (pois será melhor descrito como um complexo de espécies) nidificam duas populações, uma durante o período de Inverno, outra durante o período de verão e os indivíduos das 2 não se misturam. Nos Farilhões criam apenas de Inverno. Não há garantias de que as observações de O. castro sensu lato na nossa costa sejam de aves provientes dos Farilhões. Discordo completamente com o que dizes: "Certo, tambem sabemos onde o castro está, pelo menos tanto quanto o possivel para uma especie oceanica, e o que não sabemos ainda ficará futuramente claro com o acompanhamento de individuos com dataloggers."
Sabemos qual é a dimensão populacional da colónia dos Farilhões. É só isso que se sabe. O que será possível fazer no futuro ao futuro pertence, até lá governamo-nos com o que temos... No futuro será possível fazer coisas que nem se sonha no presente, mas isso não deve contar até ser possível e até termos a tal informação que poderá (ou não) fazer diferença. Há muita coisa ainda para se saber sobre estes bichos...
Trabalho recente feito com GPS loggers em Stercorarius maccormicki e Pterodroma cahow permite supor que as águas dos Açores e possivelmente de Portugal Continental estão nas rotas de dispersão destas espécies. Estas sim, são situações complicadas de resolver...
Abraço

Rafael Matias

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Mensagem por pedro121 Sáb Jun 23, 2012 1:22 pm

Rafael Matias escreveu:
Põe questões destas sempre que te lembres. É sempre bom discutir. Não te garanto é sempre ter tempo para responder, principalmente nestes próximos meses.
Abraço e boas observações,
Rafael

Pois, eu coloquei a questão porque pensei que eu iria ter tempo para participar mais activamente (não há aves e o ritmo laboral está a acalmar) mas...foi só colocar o tópico para começarem as reuniões de emergência e os problemas para resolver e todos de vida ou morte (a vida da pessoa com o problema e a minha possível morte se não o resolvesse) agora que as coisas parecem mais calmas queria só levantar uma questão no teu ultimo post.
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Mensagem por pedro121 Dom Jun 24, 2012 2:43 am

Bom dia,

Peço desculpa pelo atraso na resposta mas…

Bom, a questão, Rafael, é que nos estamos basicamente de acordo em relação á importância do CPR para a validação dos dados das espécies raras e com raras eu quero dizer espécies que não apareçam regularmente em Portugal continental. Mas para mim o Oceanodroma castro não é uma espécie rara, é um nidificante regular, com uma população nidificante na ordem das dezenas de casais.

Como tu bem disses:


Rafael Matias escreveu:“Sabemos qual é a dimensão populacional da colónia dos Farilhões. É só isso que se sabe. O que será possível fazer no futuro ao futuro pertence, até lá governamo-nos com o que temos... No futuro será possível fazer coisas que nem se sonha no presente, mas isso não deve contar até ser possível e até termos a tal informação que poderá (ou não) fazer diferença. Há muita coisa ainda para se saber sobre estes bichos...”


Certíssimo, mas esse trabalho a meu ver não interessa directamente ao CPR porque a espécie não é uma raridade.


Rafael Matias escreveu:“Essas alterações não devem ser feitas apressadamente, uma vez que não há qualquer ganho com isso (opinião pessoal). Quando houver essa informação disponível, e dependendo das conclusões poderá ser feita uma alteração. Imagina, por hipótese, que se conclui que as áreas de alimentação da espécie durante a época de reprodução se encontram fora da ZEE portuguesa. Então nesse caso retirava-se a necessidade de homologação?”


Para mim, retirava-se a necessidade de homologação pelo simples facto de ser um nidificante regular com uma população nidificante na ordem das dezenas de casais.


Rafael Matias escreveu:Como vês isto não é propriamente linear

Pois, aqui temos opiniões diferentes, é que para mim é completamente linear, um nidificante regular não é uma raridade. É tão simples como isso


Rafael Matias escreveu:Nos Farilhões criam apenas de Inverno. Não há garantias de que as observações de O. castro sensu lato na nossa costa sejam de aves provientes dos Farilhões.


Claro que não há, mas o que é que isso interessa realmente? Com uma observação a partir da costa nunca saberemos a que população pertence, mas se uma espécie é um nidificante regular (sim, eu estou sempre a bater na mesma tecla Smile , e sim é de propósito Very Happy ) é realmente importante para o CPR que possam aparecer cá indivíduos de outras colonias? Se são todos O. Castro?

E se forem Oceanodroma monteiroi? bom nesse caso boa sorte para o observador que a partir da costa tente provar que viu de facto um O. Monteiroi, e ai sim na minha opinião o CPR terá que se pronunciar!


Rafael Matias escreveu:Trabalho recente feito com GPS loggers em Stercorarius maccormicki e Pterodroma cahowpermite supor que as águas dos Açores e possivelmente de Portugal Continental estão nas rotas de dispersão destas espécies. Estas sim, são situações complicadas de resolver...

Estamos completamente de acordo, para mim a situação do Oceonadroma castro é mesmo muito simples de resolver.

Eu já tive a sorte de ver um Oceanodroma que identifiquei como castro (espero eu correctamente), a observação foi a todos os níveis excepcional, tanto pelo local como pela hora em que foi realizada como por ter Oceanodroma leucorhoa a passar na mesma linha de voo, sem a sorte de ver a ave nas circunstancias em que a vi duvido que tivesse sido capaz de fazer a ID, para espécies como os castro e os leucorhoa, que só aparecem junto á costa em situações de forte temporal e que se distinguem uma da outra por pormenores que tem que ser determinados em circunstancias de observação algo afastadas do ideal é necessário que o observador tenha alguma sorte também .


Não submeti nem irei submeter a minha observação ao CPR, por uma simples razão, a espécie é uma nidificante regular (lá estou eu outra vez Smile ), eu submeto sempre tudo, e de outras espécies que no futuro poderão vir a ter o seu estatuto repensado (moleiro-rabilongo e gaivota de sabine) mas nessas espécies o numero de registos feitios é ainda muito pequeno é portanto importante continuar a estudar a sua ocorrência em Portugal.

Abraço
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