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Um frio fim de tarde no estuário do Cávado

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Mensagem por Araújo da Silva Sex Fev 10, 2012 4:08 pm


Hoje dediquei a manhã à contagem de aves para o Atlas das Invernantes. Como nem a ajuda do termómetro tem trazido novidades interessantes ou engrossado os bandos das habitués, reservei o fim de tarde para recolher alguns dados adicionais para o “portugalaves”, designadamente a avaliar a dimensão dos bandos que se dirigem para a pernoita.

Cinco da tarde lá estava eu em cima da ponte velha a levar com a habitual brisa cortante de noroeste nas bentas. Mas estava agasalhado. Varri com os binóculos 360 graus à minha volta. Na ínsua sob a ponte já aguardavam a hora de partida para o freixo da margem direita 14 boieiras. Em frente ao cais da Pedra Alta, em Fão, repousavam 21 corvos-marinhos e umas 40 marrequinhas abrigavam-se numa reentrância do juncal a montante. Mais para interior, no curso principal, uma dúzia de outros corvos-marinhos ainda procurava a última refeição e só isto, além do bulício da petinha-ribeirinha da asa esquerda descaída, interrompia a monotonia geral.

Aguardei. Cheguei cedo e já contava com uma longa espera. Entretanto, os guinchos e as gaivotas agitaram-se no ar para escoltarem a passagem de uma fêmea de tartaranhão-dos-pauis. Veio de sul e seguiu para a foz onde se aglomeravam hordas de corvos-marinhos dentro de água. Mas estes já não caçavam. Os minutos continuavam a passar e só o bando das boieiras engrossava até atingir mais de 40 indivíduos. Continuei a aguardar, e nada. O sol despediu-se a nada. A luz foi-se e nada… nada. Notei que a maré começou a vazar, mas nada.

Sou daqueles que olha para a Natureza como uma mera luta pela sobrevivência e pela perpetuação dos genes. Nada de esotérico. A magia está apenas na forma como queremos olhar para os fenómenos naturais. E só!

Mas há coisas…

Quando o relógio da igreja matriz cá do burgo, que está atrasado dois minutos, assinalou com badaladas as seis da tarde, precisamente neste momento e em simultâneo, como que num tiro de partida para a corrida olímpica dos cem metros, todos os corvos-marinhos, sem exceção, ergueram-se das águas e dos torrões e zás rio acima. Quase 200 aves, dos quatro cantos do estuário a formarem “vês” e “duplos vês” e “us” e … E isto sem que grande parte delas estivesse em contato visual com as outras. Ou houvesse alguma vocalização de alarme. Nada. Parecia que tinha passado uma potente descarga elétrica nas águas e feito todas as aves saltarem fora.

E é assim todos os dias. Ontem foi um minuto mais cedo e amanhã será um minuto mais tarde.


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Mensagem por ribeiroa Sáb Fev 11, 2012 4:39 am

Bela apresentaçao.

Cumprimentos,

Antonio Ribeiro

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Mensagem por Paulo Lemos Sáb Fev 11, 2012 8:18 am

Foi como se eu estivesse lá.
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Mensagem por Jlourenço Sáb Fev 11, 2012 11:58 am


Olá Jorge,

Muito boa narrativa. De autêntico escritor.

Abraço

João

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Mensagem por sérgio moreira Sáb Fev 11, 2012 12:36 pm

Maravilha!!
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Mensagem por LuisMM Qui Fev 23, 2012 5:49 am

Boas,

O Aeromodelismo é permitido em pleno Parque Natural?

É que na passada 3ª feira de carnaval fiquei algo surpreendido ao ver 2 aviões telecomandados em altas acrobacias, junto à ponte da EN13 entre Fão e Esposende (do lado de Esposende)...
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Mensagem por Araújo da Silva Qui Fev 23, 2012 4:58 pm

Olá Luís,

… e se te referes à parte da manhã, ainda me podias encontrar ali próximo também.
Pelas 09 horas, assim que me apercebi do ajuntamento de vários adeptos de modalidade aeronáuticas, tanto a que referes como os parapentes com motor, logo chamei os vigilantes do parque natural que, como estavam atrasados, me pediram para intervir.

O piloto do parapente foi sensibilizado a levantar afastado da margem sobre a cidade e, logo que chegasse aos mil pés, já poderia sobrevoar o juncal. Este assim fez e pareceu-me pessoa de bom-senso. Além dos 4 albifrons, nada mais vi a levantar voo.

Quanto aos adeptos do aeromodelismo, apesar de me ter demorado para verificar o que se iria passar, acabei por não poder vê-los a “brincar”. NÃO ESTÁ PREVISTA A PROIBIÇÃO DESTA MODALIDADE, de qualquer modo, se for notada perturbação na fauna, é sempre recomendável avisar os responsáveis da área protegida (962981029 ou 253965830).

E se vires um “pandinha 4X4” preto mas carregado de lama, devo estar por perto. Não me custa nada falar com aquela malta, avisa-me.

Abraço

Jorge
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Mensagem por LuisMM Sex Fev 24, 2012 6:52 am

Jorge,
Estive lá só de passagem da parte da tarde, mais ou menos por volta das 15h e do passadiço de Fão deu para ver pelo menos 2 avionetas telecomandadas a voar em simultâneo (não sei se eram sempre as mesmas), mas já não vi nenhum parapente. Quanto às aves, pareceu-me ver uma rapina a voar junto à ponte e imensas aves aquáticas, pousadas no rio quer junto à ponte, quer em frente aos 2 postos de observação desse passadiço (fotos).

Parece-me que a questão da perturbação da fauna pode ter interpretações muito subjectivas, pois por muito calmas que as aves me parececem estar naquela altura, custa-me um bocado a acreditar que a barulheira que essas avionetas faziam não as perturbasse, mesmo que essas aves já estivessem habituadas a esse barulho.

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Mensagem por pedro121 Sex Fev 24, 2012 7:43 am

LuisMM escreveu:
Parece-me que a questão da perturbação da fauna pode ter interpretações muito subjectivas, pois por muito calmas que as aves me parececem estar naquela altura, custa-me um bocado a acreditar que a barulheira que essas avionetas faziam não as perturbasse, mesmo que essas aves já estivessem habituadas a esse barulho.

Pela minha experiencia elas deixam de reagir, na lagoa de Óbidos o aeródromo está literalmente apontado para a zona onde se juntam mais aves, e o facto é que na maior parte das vezes eles não reagem, só o fazem se os ultraleves vierem mesmo muito baixo, ou seja na maior parte das vezes continuam a fazer o que estava a fazer mesmo com a avioneta a passar-lhes por cima, quanto ao pessoal do aeromodelismo, esses então não incomodam mesmo nada e sempre dão jeito para me vigiarem o carro. Mas atenção que na Lagoa o pessoal está lá constantemente com as avionetas e com os “aviões” portanto as aves habituaram-se, num sítio com utilização pontual não sei como será a reacção.
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Mensagem por Paulo Lemos Sex Fev 24, 2012 12:25 pm

pedro121 escreveu:
LuisMM escreveu:
Parece-me que a questão da perturbação da fauna pode ter interpretações muito subjectivas, pois por muito calmas que as aves me parececem estar naquela altura, custa-me um bocado a acreditar que a barulheira que essas avionetas faziam não as perturbasse, mesmo que essas aves já estivessem habituadas a esse barulho.

Pela minha experiencia elas deixam de reagir, na lagoa de Óbidos o aeródromo está literalmente apontado para a zona onde se juntam mais aves, e o facto é que na maior parte das vezes eles não reagem, só o fazem se os ultraleves vierem mesmo muito baixo, ou seja na maior parte das vezes continuam a fazer o que estava a fazer mesmo com a avioneta a passar-lhes por cima, quanto ao pessoal do aeromodelismo, esses então não incomodam mesmo nada e sempre dão jeito para me vigiarem o carro. Mas atenção que na Lagoa o pessoal está lá constantemente com as avionetas e com os “aviões” portanto as aves habituaram-se, num sítio com utilização pontual não sei como será a reacção.

De facto alguns grupos de aves ou exemplares podem habituar-se a esses e a outros impactos, mas não podemos generalizar para todos.
É muito difícil nos apercebermos da reacção "da totalidade possível" das aves que um ecossistema pode acolher, pois parte da afluência é progressiva, ocasional, etc. Devido a alguns factores adversos, o ecossistema da lagoa acaba por concentrar menos aves do que as suas capacidades basicas permitem.
Mas a aeronautica é o menor dos problemas.
Daqui a dias falo disso...
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Mensagem por Araújo da Silva Sáb Fev 25, 2012 9:23 am


Viva!

Parece-me muito abstrato falarmos de aeromodelismo como uma atividade que, per si, constitua um fator de perturbação. Se também quisesse ser pouco rigoroso, poderia muito bem dizer que os birdwatchers e os fotógrafos da natureza são os que maior impacto causam nos ecossistemas e na avifauna (eu conheço alguns fotógrafos que são uns autênticos atentados ambientais).

É repetitivo dizer isto, mas tudo depende do grau de esclarecimento e da sensibilidade de quem pratica a sua actividade recreativa de eleição.

Assim, conforme já aqui disse, na 3ª-feira de carnaval aguardei para ver o pessoal dos “aviõezinhos” a brincar. Já me chegaram várias reclamações e estou a preparar uma exposição às autoridades que pretendo que lhes chegue bem fundamentada e documentada. Em resumo, não quero “falar de cor” para que a minha intervenção não perca eficácia.

Manterei a comunidade informada dos desenvolvimentos desta situação.

Abraços

Jorge

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Mensagem por Paulo Lemos Sáb Fev 25, 2012 11:47 am

Araújo da Silva escreveu:
Se também quisesse ser pouco rigoroso, poderia muito bem dizer que os birdwatchers e os fotógrafos da natureza são os que maior impacto causam nos ecossistemas e na avifauna (eu conheço alguns fotógrafos que são uns autênticos atentados ambientais).

É repetitivo dizer isto, mas tudo depende do grau de esclarecimento e da sensibilidade de quem pratica a sua actividade recreativa de eleição.

Fazes bem em agir, e se é com conhecimento "fundamentado", mais valioso será para defesa de um valor natural.

Nalguns casos o problema nem são as pessoas, é a ausencia de correcta gestão, é não existirem estatutos especiais tornados evidentes, conhecidos e respeitáveis, quando e onde se justificam. Nisso há muito trabalho a fazer julgo, um pouco por todo o lado.



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