Abutres estão a passar fome

Henk Feith escreveu:Fico só com a seguinte dúvida: se já é proibido deixar carcaças no terreno há pelo menos uma décade, a que fator se deve então o aumento e/ou manutenção das atuais populações de abutres em Portugal neste mesmo período?Henk

Acho que há vários factores - apesar de legislação alguns pastores ainda deixam ovelhas mortas no campo, para evitar custos de veterinário e os serviços de recolha - também se veja onde existe Grifos tudo o ano podes verificar que estes estão em grandes áreas de habitat tipo estepa e coincidam com áreas onde ainda existe bastantes animais domésticos - Também estas áreas são próximo a fronteira com Espanha.

Deve ver mais razões, mas deixo estas para os mais entendidos.


Um abraço

Simon

Henk Feith escreveu:Concordo com muito o que foi dito aqui por pessoas que sabem muito mais disto que eu. Fico só com a seguinte dúvida: se já é proibido deixar carcaças no terreno há pelo menos uma décade, a que fator se deve então o aumento e/ou manutenção das atuais populações de abutres em Portugal neste mesmo período?

Dito isto, concordo que era melhor deixar as carcaças no terreno.

Henk

Henk,

Creio que seria importante contextualizarmos estes aumentos, nomeadamente em termos temporais.

- no caso do abutre do Egipto (britango) a tendência é de regressão e não de aumento, como aliás já foi referido;
- no caso do abutre-preto, a população nidificante é de 1 casal, máximo 2 e nem sei se nidificam todos os anos; estamos a falar de uma população marginal e irregular, por isso falar de "aumento" é, a meu ver, excessivo;
- por fim, o caso do grifo: é inegável que houve um aumento, mas é importante recordar que esse aumento se registou na década de 1990; não é claro para mim que após o ano 2000 a população tenha continuado a aumentar (o último censo nacional data de 1999); aliás disso convém lembrar que uma grande parte da população "nacional" nidifica, na realidade, em território espanhol - refiro-me concretamente aos mais de 100 casais que nidificam do lado espanhol do Douro Internacional. A sul do Tejo há apenas uma colónia situada no concelho de Marvão e que conta com 3-4 casais, essa colónia não tem aumentado desde há 10 anos para cá e não há mais nenhuma colónia a sul do Tejo.

Em suma, à falta de dados quantitativos que o demonstrem, para mim não existe uma base sólida para afirmar que na última década a população de abutres em Portugal sofreu um aumento...

1 abraço,
Gonçalo

Gonçalo,

A colónia de Grifos nas Portas de Ródão esta em aumento?

Nos concelhos de Castro Verde e Mértola tenho a iimpressão que os Grifos que visitam (provavelmente imms na sua maioria) da forma diária contem com menos indivíduos agora de que uns 3 ou 4 anos atrás. Agora raramente vejo mais de que uns 50-80 inds quando antes mais de 100 era regular.

Um abraço

Simon

Simon Wates escreveu:Gonçalo,

A colónia de Grifos nas Portas de Ródão esta em aumento?

Olá Simon,

Não tenho números recentes, mas para mim não é evidente que esteja a aumentar.

Em 2001 havia lá 40 casais, e não me parece que actualmente haja mais que isso.

Simon Wates escreveu:Nos concelhos de Castro Verde e Mértola tenho a iimpressão que os Grifos que visitam (provavelmente imms na sua maioria) da forma diária contem com menos indivíduos agora de que uns 3 ou 4 anos atrás. Agora raramente vejo mais de que uns 50-80 inds quando antes mais de 100 era regular.

Não tenho números concretos, mas aqui só com séries longas de observações poderemos chegar a alguma conclusão...

O aumento do Grifo em Portugal que foi sim notorio nos 90, é uma extensão do caso espanhol, e uma população marginal da população espanhola. As colonias mais importantes estão na sua maioria situadas nas zonas fronteiriças e dependentes da procura de alimento em Espanha, nas grandes fincas de caça, fincas com gado e alimentadores, caso contrário ja se tinham expandido para o centro de Portugal onde há fragas com condições para nidificarem.
Falo sobretudo da região da Beira Baixa que melhor conheço, é provavel que no Douro, com a presença do Lobo que os Grifos beneficiem de uma alimentação dita mais natural, e façam movimentos menos previsiveis na procura de alimento.Vejo-os com frequência ás portas de Bragança, a visitarem uns redis de ovelhas da zona, e inclusive a alimentarem-se de gado morto a menos de 10 km da cidade, mas penso que as colonias se têm mantidos estáveis e nos mesmos locais tambem.

O grosso das aves das Portas e colonias adjacentes, deslocam-se todos os dias sem excepção no sentido de Espanha e pelo vale do Tejo acima para se alimentarem e não no sentido contrário, embora o ano passado tenha observado uma ave adulta em época de nidicação a procurar alimento na zona do Sicó/Alvaiázere, e proveniente provavelmente da colonia mais interior de Portugal a cerca de 80km, mas a 30km da fronteira.
Este é concerteza um caso atipico, pois na maioria as colonias parecem instalar-se num perimetro á fronteira em que o custo energetico de voo na obtenção de alimento não seja elevado e talvez sobretudo que a provisão de alimento regular esteja assegurada, para alimentar a cria.


cumps,
Rui

Em África, por exemplo, as aves reprodutoras podem de facto percorrer muitas dezenas de Kms em busca de recursos para as crias. Mas fazem-no quase seguros de que os encontram, ou seja, andam por território já conhecido e minimamente fiável em alimento.

Fora da zona regular dos "nossos" abutres, como o Litoral Oeste, já foram feitas observações e até recolhas destes animais em estado quase "terminal" de fome. Isto sugere a ideia de que os que divagam sem destino, podem pagar caro por isso (jovens, etc, a adquirir experiência ou a sucumbir diante dela).
As nossas aves mais experientes e adultas, e eventuais outras que as seguem, talvez sejam menos propensas a divagar porque os recursos estão concentrados em território já conhecido (deste país ou vizinho). As adultas que quebram essa regra, afastando-se mais, sabem exactamente o que procuram (como o caso da observação do Rui?).
Em conclusão, o país parece ter actualmente condições limitadas e irregulares para manter uma população de abutres que é experiente.

Assim, nos locais mais propensos conhecidos, a alimentação deve permanecer minimamente regular, caso contrário podem surgir problemas.
Se os recursos faltarem, os abutres não têm para onde ir. O mais provável é aumentar a sua agressidade (e não a dispersão pelo território) não querendo dizer que os ataques derivem do estado da população.
A falta de alimento nas condições descritas pode até favorecer comportamentos desviantes, depois difíceis de irradicar quer social, quer individualmente.
Estarei muito longe da verdade?

O que faltará aqui senão suprir "carências" e depressa?
Tal como disse no último post, o ultimo elo no nicho alimentar mais natural dos abutres é raríssimo em Portugal (Lobo) e até esse consome hoje presas que pouco sobram para necrófagos. Ou seja, esse não conta.

RuiCaratao escreveu:Os ataques é sobretudo a borregos muito jovens, e inclusive chegam a seguir as ovelhas que estão para parir, e assim que nascem...pimba. Mas em atitute concertada de ataque\predação, com vários individuos envolvidos.

Esse comportamento é normal por todo o mundo, em aves necrófagas experientes (e nas que as seguem), por causa da placenta!
Se chegam a atacar o recém-nascido que vem agarrado, é porque estão desesperados ou já se habituaram, tendo depois passado para as sucessivas fases seguintes.

Exacto Paulo, mas isto em resposta ao Henk, de que na minha opinião, Portugal não tem recursos para alimentar a população actual de Grifo caso hipoteticamente faltasse a providência alimentar espanhola.
Caso a vontade de que a população nacional se mantenha nos numeros actuais, a estrategia do ICNB deverá ser a mesma (não mexer/nem actuar)???!!!!, e rezar para que continue a correr tudo bem.....inclusive para o britango e abutre-preto, que com sorte e à semelhança da Cabra do Gerês e da Águia-Imperial, talvez benefeciemos de medidas adoptadas pelos nossos vizinhos

Simon, se os mesmos ataques acontecem na área do Baixo alentejo, apesar de as aves serem espanholas o problema esse, é bem português, e deveria na minha opinião ser minimizado, onde deixar o gado no campo seria uma opção, ou um alimentador unico na região, que pudesse mesmo proporcionar a monitorização das aves, e assim mostrar as tendências da presença de Grifos na região.

Na zona de Vilar Formoso , os grifos e abutres - pretos provenientes das colonias espanholas da serra da Gata e Penhã de Francia veêm-se a sobrevoar a zona durante grande parte do dia , desde as 10 da manhã até cerca das 16h , é certo que nunca observei grupos com mais que 20 individuos , mas já observei mais que um grupo na mesma zona , e noto também que entram cada vez mais dentro do território português , há cerca de 10 anos atrás nunca tinha visto grifos a Oeste do Rio Côa , hoje em dia é habitual isso acontecer . Concluo que os grifos ao passarem grande parte do dia por estas zonas é sinal que conseguem encontrar alimento suficiente , e cada vez mais nestas zonas existem as chamadas " vacas de campo " , em propriedades vedadas , nalguns casos chegam a ser muitas dezenas de bovinos em propriedades enormes e em zonas de dificil acesso , ora se um destes bovinos morrer , o proprietario até dar pela sua falta , e após dar pela sua falta até o conseguir encontrar pode levar vários dias , de certeza que os grifos conseguem detectar o cadáver primeiro . Já observei também os grifos a alimentarem-se de cadáveres de pequenos animais colhidos pelo comboio , como tal parece-me que neste caso e tendo em conta o numero de grifos na zona , conseguem alimento suficiente .

Pois, é quase certo que há sempre algo que "ainda não sabemos".
Pergunta-se é se esse suposto "alimento suficiente" é também "regular" ou não. Ou, como estarão as aves a ser tratadas do lado de lá da fronteira?

Serão provenientes certamente de espanha António, pelo menos os pretos, mas serão aves reprodutoras ou subadultos errantes que á semelhança do alentejo tambem procuram alimento na zona?
Convem diferenciar os recursos troficos necessários em cada região para a população reprodutora nacional, daquilo que seria necessário para alimentar todas as aves que frequentam os céus de Portugal de uma forma mais errática.

Um plano nacional de Abutres seria uma boa ideia com medidas direccionadas a cada especie e ás necessidades de cada região...pode ser que seja desta.

cumps,
Rui

Sim Rui , tal como referi serão certamente provenientes de Espanha , quanto á tua questão é dificil de avaliar que tipo de individuos frequentam a zona , achas que a direção dos ventos poderá influenciar as rotas diárias destas aves ? Quanto á população reprodutora nacional , e á excepção da colonia das Portas de Rodão , toda ela está paredes meias com Espanha tanto podendo alimentar-se do lado de lá como do lado de cá do território , tal como referes um estudo era muito bem vindo .

Posso adiantar que durante os muitos voos que faço em voo livre em zonas de Abutres (Freixo Espada Cinta, Mogadouro, Fois (sabugal), Castelo Vide e Mértula), nós os parapentistas já notamos algumas rotas que eles usam e consequentemente nós tb as usamos, já reparei que na zona de Foios (perto Vilar Formoso) a rota de passagem é sempre a mesma quer no sentido ES-PT quer no sentido de retorno PT-ES.
Quanto á questão do vento alterar o percurso, claro que sim, mas a eficiencia destes animais faz com que o peso do vento não seja tão importante como para animais pequenos.
Na zona do Alto Alentejo já vi muitas dezenas na zona de Nisa a devorarem carcaças de vacas... não me parece que se aventurem para cá do Tejo.
Parece-me que o grupo mais localizado será no Penedo durão pois as térmicas estão sempre marcadas por estes amigos do ar.
posso já agora partilhar que chegamos a subir com eles durante 30 min na mesma térmica e chegam a encostar (1 m) aos nossos parapentes e com uma atitude curiosa e nunca violenta, nunca ouvi um relato de ameaça, ao contrário de algumas Águias que ameaçam atacar (nunca junto a ninhos, falo em simulações de ataques a 3000 m de altitude, eu próprio já tive um encontro com uma Calçada que cheguei a gritar).
Este ano vou tentar montar uma camara para filmar esta interactividade e enviar para o forum.
Se por acaso alguém quiser voar em bi-lugar para ver estes maravilhosos bichos em voo , diga pois estou ao dispôr, e teri muito gosto.

Tangente ao tópico mas relativamente ao semanário SOL deparei-me com a seguinte notícia na capa do referido semanário de dia 3 de Fevereiro.

Palmeiras morrem no Parque Natural da Arrábida

Intrigado e não esperando boa coisa, fui ler - interessa-me a temática do gorgulho-da-palmeira.

A página 39 abria então com a seguinte parangona

Palmeiras em extinção na Arrábida

e como sub-título:

Praga do escaravelho está a condenar à morte dezenas de árvores no Parque Natural

O artigo é uma confusão horrenda e pensado (?) de um modo peculiar, desde as citações de Paulo Martins (que pelo que nos é dado a conhecer fala com o título honorífico de filho-da-terra) até à insinuação de que o ICNB está a deixar morrer a palmeira que se pode extinguir (sem comentários sobre o uso de extinção aqui) do perímetro urbano de Setúbal! E o continuado uso de escaravelho (é de facto um gorgulho) é também de salientar - bem como a mistura de tópicos entre esta palmeira e a palmeira-das-vassouras. Uma salganhada horrenda assinada por Sónia Balasteiro, que denota fraca preparação para assinar tais coisas.

Na página ao lado, uma chamativa fotografia de um macho de Anas clypeata. Novo artigo de Sónia Balasteiro:

Cristar quer proteger patos selvagens

Não resisti, lá fui eu ler...

"Baixo número de espécies de patos justifica retirada do calendário de caça"

Este artigo não estava tão mau como o do gorgulho, ainda assim fico preocupado quando quem escreve estes artigos não sabe a diferença entre espécie e indivíduo. Se isto tivesse a diversidade da Colômbia, então sim, poderia haver fogacho grosso. Assim... não.

Deixo-vos com algumas pérolas da sabedoria popular de Paulo Lemos, o tal filho-da-terra que o SOL considerou ser o especialista a consultar sobre o caso do gorgulho e das palmeiras exóticas em vias de extinção em Portugal:

"Grande parte destas árvores tem várias dezenas de anos. É uma pena desaparecerem"

(acrescento eu, é uma catástrofe sem paralelo! Dezenas, senhores, dezenas...)

"Na Arrábida as palmeiras fazem parte da paisagem natural, são fundamentais"

(fun-da-men-tais. Nem mais!)

Desculpem a tangente, mas isto apenas para ilustrar que o jornalismo ambiental no SOL não prima pelo rigor, e pelo que vemos aqui envereda pelo sensacionalismo - mesmo que para isso haja que fazer parangonas sobre extinção de árvores de jardim... É que podiam ter explorado a questão das espécies exóticas, ou a entrada do gorgulho em Portugal via comércio de palmeiras - mas não. É alarmismo puro e duro.

Sobre os abutres, apesar do alarmismo da notícia, fico também preplexo pela não aplicação das sugestões da BirdLife, e pela burocracia estatal. As 'carrinhas-da-morte' parecem-me uma coisa atroz, e capazes de disseminar mais pessonha que evitá-la, e se as coisas puderem ser feitas pelos próprios pastores sem terem de pagar por isso, e ao mesmo tempo tornar mais imprevisível as fontes de alimentação dos abutres - excelente.

P.S. Reparei agora que havia um link para o artigo do SOL, o dos abutres. Noto que Sónia Balasteiro assina mais esta bonita peça jornalistica, ilustrando-a com espécies características de Portugal continental

http://sol.sapo.pt/inicio/Vida/Interior.aspx?content_id=42233

encontrei também a mimosa peça sobre a extinção das palmeiras sadinas

http://sol.sapo.pt/pesquisa/default.aspx?search=palmeiras%20em%20extin%E7%E3o

Boas pessoal.

Venho despertar este tópico novamente devido a uma declaração da Associação Transumancia e Natureza que tem feito monitorização de Necrófagos.

http://www.atnatureza.blogspot.pt/2012/03/situacao-actual-das-aves-necrofagas.html

Parece qe vai de encontro ao que li por aqui

Aaaaiii esta malta dos media!

Cumps
Filipe Matias

Bom, que lufada de ar fresco para afastar o balofo cheiro a jornalismo "necrófago".

Muito bem mesmo.

Parabens a esta extraordinária associação que vai pelo nome de ATN!

Henk Feith